segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

O Quanto você é Autocompassivo?




Autocompaixão
 O segredo para a ação com poderes é aprender a não debater-se.


Por Emma Seppala

Esforce-se para trabalhar ainda mais, tenha como objetivo de ser ainda melhor! Vivemos em uma sociedade que nos envia regularmente tais mensagens. Ao mesmo tempo, muitos de nós não paramos para refletir se os nossos objetivos são realmente possíveis, ou se aquilo que mais desejamos vai nos trazer uma felicidade duradoura. Mesmo que fosse ganhar uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos, o nosso status de campeão só duraria alguns anos e provavelmente seria acompanhada da ansiedade sobre perdermos o status num futuro próximo. Afinal o sucesso é uma posição precária. Enquanto nós nos esforçamos para nos tornamos infalíveis  e mantermos a nossa posição no topo, não podemos escapar do sofrimento.

Aprendemos desde muito cedo nos tempos de escola, a suar a camisa, lutar e nos esforçarmos para nos destacarmos nos estudos, a estarmos entre os melhores. Para a maioria de nós esta experiência é difícil de suportar, e nos deixa imaginando se essa competitividade enlouquecedora pode ser a razão pelo qual a ansiedade e depressão são excepcionalmente galopantes nos campos estudantis.

Kristin Neff, Professora de Desenvolvimento Humano na Universidade do Texas e pioneira na pesquisa sobrea a auto compaixão, acredita que a ênfase da nossa sociedade na realização e na autoestima, está no coração de muito sofrimento desnecessário e é até contraproducente. Desde a tenra idade, somos ensinados a construir a nossa autoestima na competição pelo sucesso, mas a competição é uma batalha perdida. Psicólogos descobriram que a maioria das  pessoas acreditam que estão acima da média, e que são melhores do que os outros em quase todas as características (melhor do que o efeito médio). Essa crença nos ajuda a afastar os sentimentos dolorosos de inadequação, mas ele vem junto com um preço.


Quando a nossa autoestima se baseia na premissa de competir para ter sucesso contra os outros, estamos sempre precariamente oscilando à beira da derrota.  A comparação social e a concorrência também promovem o desligamento por nos fazer enxergar os outros como obstáculos a serem superados, a fim de mantermos a nossa posição, demarcar o nosso território e vencermos nossos potenciais rivais. Em ultima análise, nos sentimos mais separados os demais quando na verdade o objetivo principal de atender o desejo do sucesso é termos o sentimento de pertencimento e de sermos amados.

É simplesmente impossível sermos melhores do que todo mundo em todos os aspectos todo o tempo. No entanto, a pesquisa mostra que quando perdemos, temos a tendência a nos sentirmos muito autocríticos, aumentando assim a nossa própria miséria interior. Confrontado com as críticas, tornamo-nos defensivos e podemos deste modo nos sentir esmagados. Erros e falhas nos tornam inseguros e ansiosos muito cedo quando somos confrontados com os desafios futuros.  A concorrência pela autoestima tem sido vinculada a grandes problemas sociais, como a solidão, isolamentos e até mesmo o preconceito.

Depois de observar as armadilhas da autoestima, Neff foi à procura de uma alternativa, uma maneira de definir e alcançar os nossos objetivos sem nos debatermos ou atingirmos qualquer outra pessoa no processo.  Através da prática do Budismo, ela encontrou a Autocompaixão.  E com a Autocompaixão, ela compreendeu como o indivíduo pode valorizar a si – mesmo, não porque julgou a si – mesmo de forma positiva e, negativamente os outros, mas porque o indivíduo está intrinsicamente merecedor de cuidado e preocupação, assim como todo mundo. Quando a autoestima nos deixa impotente e perturbado, a autocompaixão está no centro de capacitação, aprendizagem e força interior.

Trate-se como o seu melhor amigo

Trabalhar duro, esforçar-se para atender seus objetivos e, realizar da melhor maneira o seu potencial são, obviamente habilidades tremendamente uteis nas áreas do crescimento profissional tanto como na pessoal. No entanto, a pesquisa de Neff sugere que a substituição da autoestima pela autocompaixão pode ter implicações excelentes para a nossa saúde mental e bem-estar. Em um estudo, por exemplo, Neff descobriu que quando confrontados com uma situação de risco (por exemplo, ter que descrever as suas fraquezas durante uma entrevista de emprego), a autocompaixão foi associada com aquela que produz uma menor ansiedade, enquanto a autoestima não causou impacto aos altos níveis de ansiedade.


Neff define Autocompaixão como “ser gentil e compreensivo em relação a si – mesmo em casos de dor ou fracasso, ao invés de ser duramente autocrítico; percebendo suas próprias experiências como parte da experiência humana mais ampla, ao invés de vê-las como um caso isolado; e mantendo pensamentos e sentimentos dolorosos com consciência atenta, ao invés de sobre identificar-se com eles”.

É de certa forma, assumir a atitude que se pode ter com um amigo que falhou em alguma coisa. Ao invés de repreendê-lo, julgando e acrescentando críticas ao seu desespero, ouvimos com empatia e compreensão, incentivando – o a lembrar-se que os erros e as falhas humanas são normais é, validar as suas emoções sem adicionar combustível ao fogo que já arde em seu interior.

Neff explica que a autocompaixão não é uma forma de evitar a realização dos desejos ou tornar-se autoindulgente. Em vez disso, a autocompaixão é um grande motivador porque envolve o desejo de aliviar o sofrimento, curar, prosperar e para ser feliz. Um pai que se preocupa com o filho, vai insistir para que ele coma mais legumes não importa o quanto a experiência possa ser desagradável para ela. Da mesma forma, a autocompaixão pode ser fácil e apropriada em algumas situações, mas em tempos de excesso de indulgência e preguiça, ela também envolve endurecimento e impõe a importância de se assumir responsabilidades.

Uma melhor maneira de lidar

Quando você está motivado pela autocompaixão, enxerga contratempos como a melhor oportunidade de aprendizagem.  A crítica, por exemplo, geralmente consiste em um grão de verdade no que diz respeito a nós, e um grão de ressentimento ou inverdade no que se refere à percepção do crítico. Devido à picada que acompanha as críticas, quer fique na defensiva ou no ato de debater-se, perdemos a lição útil. Com a autocompaixão, no entanto, ver o fracasso com calma e procurar entende-lo como uma oportunidade de crescimento que ele pode proporcionar.

Além disso, ao impedir os efeitos derrotando a autocritica, a autocompaixão nos permite a manutenção da paz de espirito e, assim manter a nossa energia. Colocar a cabeça no lugar e compreender a face da rejeição, do fracasso ou crítica restante, permite que desenvolvamos uma força inabalável e desta forma garantimos a estabilidade emocional independente das circunstancias externas. Neff explica que a autocompaixão proporciona uma sensação estável de autoestima que oscila muito menos ao longo do tempo, porque não depende de olharmos de determinada maneira ou tenhamos que competir com o sucesso. Desta forma, permite-nos tanto a experiência de bem-estar como que possamos contribuir de maneira significativa com a sociedade.

Embora a investigação sobre a fisiologia da autocompaixão contra a autocrítica ainda esteja pendente, Neff determinou uma hipótese a partir de um modelo simples. Sabemos que a autocrítica ativa o sistema nervoso simpático (luta ou fuga) e eleva os hormônios do stress, como o cortisol em nossa corrente sanguínea. Quando isto acontece, algo toma conta de nós e não aprendemos a nos envolver com o núcleo da verdade que pode estar lá só para nos servir. A autocompaixão, por outro lado, pode acionar o sistema de prestação de cuidados dos mamíferos, os hormônios de filiação e amor, como a Oxitocina. Também conhecido como o “hormônio do aconchego”, a Oxitocina é liberada em mães lactantes, durante um abraço ou ao fazer sexo, e está associada aos sentimentos de bem-estar, que nos permite manter a verdade, sem atacar a nós mesmos.

Desenvolvendo a Autocompaixão

Nós todos conhecemos pessoas que parecem cuidar de todo mundo, mas não cuidam de si – mesmas e ainda se repreendem por não fazerem ainda mais. O trabalho de Neff confirma esta observação: não há correlação entre o traço de autocompaixão e sentimentos de compaixão para com os outros. Ela notou que muitas pessoas, mulheres em particular, são mais compassivas e gentis com os outros  do que com si – mesmas. Ela dá o exemplo de uma enfermeira de oncologia pediátrica, que passou a vida entregando-se ao cuidado dos pacientes, mas sempre alegava não estar fazendo o suficiente.

No entanto, a autocompaixão pode ser aprendida. É uma prática que pode ajudar todos nos a nos tornamos menos autocríticos, e talvez até a conseguir mais para dar mais. Um grande exemplo de autocompaixão é o de Bonnie Thome que se dedicou ao trabalho humanitário ao longo de sua vida, começando com o cuidado às crianças de rua, jovens carentes e prostitutas, elevando com sucesso os fundos para organizações sociais. Mais recentemente, ela está liderando a agenda de financiamento para o centro da Universidade de Wisconsin – Madison que prepara uma rigorosa pesquisa científica para melhorar o bem – estar da comunidade. Bonnie explica: “A autocompaixão me dá permissão para respirar a minha própria humanidade em cada situação que surge e me cumprimenta e transmite essa energia em bondade para com os outros”. Para conhecer Bonnie é necessário vê-la tirar proveito de todas as oportunidades enquanto interage para conectar-se com os outros na amizade, com calor humano e na intenção de servir aos outros onde ela puder.

Bonnie explica que, quando era criança, ela recebeu uma enorme pressão para ser uma realizadora e ter sucesso. Tinha poucos modelos de compaixão e era muito autocrítica. No entanto, quando foi colocada em um orfanato, testemunhou a compaixão incondicional dos pais adotivos, bem como o amor que dedicavam aos outros filhos adotivos de diversas raças e origens. Bonnie atribui seu amor e respeito ao ambiente seguro que eles proporcionaram para o seu desenvolvimento como uma pessoa mais integrada, criativa e compassiva. Através da aceitação e carinho de seus pais adotivos, a voz da autocrítica que havia dentro dela começou a se acalmar. Bonnie ainda mantém aquela voz crítica de forma calma e tranquila através da prática meditativa regular.

Os Três Elementos da Autocompaixão

1.         Auto Bondade – Autocompaixão implica em ser caloroso e compreender a nós mesmos quando sofremos, falhamos ou nos sentimos inadequados, em vez de ignorar a nossa dor ou de nos flagelarmos com a autocrítica. As pessoas auto compassivas reconhecem a imperfeição do ser, suas faltas e fracassos e em como as dificuldades da vida são inevitáveis, por isso elas são gentis consigo mesmas quando confrontadas com experiências dolorosas;

2.         Humanidade Comum – A Autocompaixão envolve reconhecer o sofrimento  e que a inadequação pessoal é parte da experiência, algo compartilhado por todo ser humano, ao invés de ser algo que acontece somente a “mim”. Significa, também, reconhecer os pensamentos pessoais, sentimentos e ações que são impactados por fatores externos, como a historia da família, principalmente dos pais, a cultura e condições genéticas e ambientais, bem como, o comportamento e as expectativas dos outros. Thich Nhat Hahn (Monge Zen Budista) chama a intrincada teia de causa e efeito recíproco em que estamos todos encaixados de “interser”. Reconhecendo a nossa inter existência essencial nos permite ser menos críticos sobre nossas falhas pessoais. Afinal de contas, quantas pessoas iriam escolher conscientemente ter problemas de raiva, dependência, debilidade ou ansiedade social, transtornos alimentares e assim por diante?

3.         Mindfulness – A autocompaixão também exige uma abordagem equilibrada para as nossas emoções negativas, de modo que os sentimentos não são suprimidos nem exagerados. Essa postura equilibrada decorre do processo de relatar as experiências pessoais junto com de outras pessoas que também estão sofrendo, colocando a nossa própria situação em uma perspectiva mais ampla. Também decorre da vontade de observar nossos pensamentos e emoções negativas, com mais abertura e clareza, de modo que elas são mantidas em consciência atenta. Mindfulness é um estado mental receptivo, sem julgamento no qual observamos os pensamentos e sentimentos como eles realmente são, sem tentar suprimir ou negá-los. Não podemos ignorar a nossa dor e sentir compaixão por nós mesmos ao mesmo tempo. Ao mesmo tempo, a atenção plena requer que nós não nos sobre identifiquemos com pensamentos e sentimentos, de modo que sejamos presos e arrastados pela reação negativa. – Kristin Neff, Ph.D.

Existem diversas formas de aplicar a autocompaixão. Se desejar aprender mais participe do Curso de Terapia Focada na Autocompaixão ou escreva para Saleela Devi.

Este artigo foi publicado originalmente na Spirituality and Healh, uma revista que abrange uma ampla gama de tópicos sobre saúde e espiritualidade, que podem incluir fé, filosofia oriental, meditação e religião em geral; nutrição, bem-estar, Yoga e medicina.


Texto adaptado por Sonia Ap F Santos (Saleela Devi)

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