O segredo
para a ação com poderes é aprender a não debater-se.
Por Emma Seppala
Esforce-se para trabalhar ainda mais, tenha
como objetivo de ser ainda melhor! Vivemos em uma sociedade que nos envia
regularmente tais mensagens. Ao mesmo tempo, muitos de nós não paramos para
refletir se os nossos objetivos são realmente possíveis, ou se aquilo que mais
desejamos vai nos trazer uma felicidade duradoura. Mesmo que fosse ganhar uma
medalha de ouro nos Jogos Olímpicos, o nosso status de campeão só duraria
alguns anos e provavelmente seria acompanhada da ansiedade sobre perdermos o
status num futuro próximo. Afinal o sucesso é uma posição precária. Enquanto nós
nos esforçamos para nos tornamos infalíveis
e mantermos a nossa posição no topo, não podemos escapar do sofrimento.
Aprendemos desde muito cedo nos tempos de
escola, a suar a camisa, lutar e nos esforçarmos para nos destacarmos nos
estudos, a estarmos entre os melhores. Para a maioria de nós esta experiência é
difícil de suportar, e nos deixa imaginando se essa competitividade
enlouquecedora pode ser a razão pelo qual a ansiedade e depressão são excepcionalmente
galopantes nos campos estudantis.
Kristin Neff, Professora de Desenvolvimento
Humano na Universidade do Texas e pioneira na pesquisa sobrea a auto compaixão,
acredita que a ênfase da nossa sociedade na realização e na autoestima, está no
coração de muito sofrimento desnecessário e é até contraproducente. Desde a
tenra idade, somos ensinados a construir a nossa autoestima na competição pelo
sucesso, mas a competição é uma batalha perdida. Psicólogos descobriram que a
maioria das pessoas acreditam que estão
acima da média, e que são melhores do que os outros em quase todas as
características (melhor do que o efeito médio). Essa crença nos ajuda a afastar
os sentimentos dolorosos de inadequação, mas ele vem junto com um preço.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhA-Or-ZoSj6DLWSrA1mx9IlhGuZmPvp9VILHy72QJ-w_e0sdfMuU_zjrJChOAp5o739oCTmpd9qdFvoNJ2hZdlpRW0sLhxt1mfwFZGMY657VZz2_YxTDLvt8INdAOlTPAJbGeTEseWGGg/s1600/camp+4.jpg)
Quando a nossa autoestima se baseia na
premissa de competir para ter sucesso contra os outros, estamos sempre
precariamente oscilando à beira da derrota.
A comparação social e a concorrência também promovem o desligamento por
nos fazer enxergar os outros como obstáculos a serem superados, a fim de
mantermos a nossa posição, demarcar o nosso território e vencermos nossos
potenciais rivais. Em ultima análise, nos sentimos mais separados os demais
quando na verdade o objetivo principal de atender o desejo do sucesso é termos
o sentimento de pertencimento e de sermos amados.
É simplesmente impossível sermos melhores do
que todo mundo em todos os aspectos todo o tempo. No entanto, a pesquisa mostra
que quando perdemos, temos a tendência a nos sentirmos muito autocríticos,
aumentando assim a nossa própria miséria interior. Confrontado com as críticas,
tornamo-nos defensivos e podemos deste modo nos sentir esmagados. Erros e falhas
nos tornam inseguros e ansiosos muito cedo quando somos confrontados com os
desafios futuros. A concorrência pela
autoestima tem sido vinculada a grandes problemas sociais, como a solidão,
isolamentos e até mesmo o preconceito.
Depois de observar as armadilhas da
autoestima, Neff foi à procura de uma alternativa, uma maneira de definir e
alcançar os nossos objetivos sem nos debatermos ou atingirmos qualquer outra
pessoa no processo. Através da prática
do Budismo, ela encontrou a Autocompaixão.
E com a Autocompaixão, ela compreendeu como o indivíduo pode valorizar a
si – mesmo, não porque julgou a si – mesmo de forma positiva e, negativamente os
outros, mas porque o indivíduo está intrinsicamente merecedor de cuidado e
preocupação, assim como todo mundo. Quando a autoestima nos deixa impotente e
perturbado, a autocompaixão está no centro de capacitação, aprendizagem e força
interior.
Trate-se
como o seu melhor amigo
Trabalhar duro, esforçar-se para atender seus
objetivos e, realizar da melhor maneira o seu potencial são, obviamente
habilidades tremendamente uteis nas áreas do crescimento profissional tanto
como na pessoal. No entanto, a pesquisa de Neff sugere que a substituição da
autoestima pela autocompaixão pode ter implicações excelentes para a nossa
saúde mental e bem-estar. Em um estudo, por exemplo, Neff descobriu que quando
confrontados com uma situação de risco (por exemplo, ter que descrever as suas
fraquezas durante uma entrevista de emprego), a autocompaixão foi associada com
aquela que produz uma menor ansiedade, enquanto a autoestima não causou impacto
aos altos níveis de ansiedade.
Neff define Autocompaixão como “ser gentil e compreensivo em relação a si –
mesmo em casos de dor ou fracasso, ao invés de ser duramente autocrítico;
percebendo suas próprias experiências como parte da experiência humana mais
ampla, ao invés de vê-las como um caso isolado; e mantendo pensamentos e
sentimentos dolorosos com consciência atenta, ao invés de sobre identificar-se
com eles”.
É de certa forma, assumir a atitude que se
pode ter com um amigo que falhou em alguma coisa. Ao invés de repreendê-lo,
julgando e acrescentando críticas ao seu desespero, ouvimos com empatia e
compreensão, incentivando – o a lembrar-se que os erros e as falhas humanas são
normais é, validar as suas emoções sem adicionar combustível ao fogo que já
arde em seu interior.
Neff explica que a autocompaixão não é uma
forma de evitar a realização dos desejos ou tornar-se autoindulgente. Em vez
disso, a autocompaixão é um grande motivador porque envolve o desejo de aliviar
o sofrimento, curar, prosperar e para ser feliz. Um pai que se preocupa com o
filho, vai insistir para que ele coma mais legumes não importa o quanto a experiência
possa ser desagradável para ela. Da mesma forma, a autocompaixão pode ser fácil
e apropriada em algumas situações, mas em tempos de excesso de indulgência e
preguiça, ela também envolve endurecimento e impõe a importância de se assumir
responsabilidades.
Uma melhor
maneira de lidar
Quando você está motivado pela autocompaixão,
enxerga contratempos como a melhor oportunidade de aprendizagem. A crítica, por exemplo, geralmente consiste
em um grão de verdade no que diz respeito a nós, e um grão de ressentimento ou
inverdade no que se refere à percepção do crítico. Devido à picada que
acompanha as críticas, quer fique na defensiva ou no ato de debater-se,
perdemos a lição útil. Com a autocompaixão, no entanto, ver o fracasso com
calma e procurar entende-lo como uma oportunidade de crescimento que ele pode proporcionar.
Além disso, ao impedir os efeitos derrotando
a autocritica, a autocompaixão nos permite a manutenção da paz de espirito e,
assim manter a nossa energia. Colocar a cabeça no lugar e compreender a face da
rejeição, do fracasso ou crítica restante, permite que desenvolvamos uma força
inabalável e desta forma garantimos a estabilidade emocional independente das
circunstancias externas. Neff explica que a autocompaixão proporciona uma
sensação estável de autoestima que oscila muito menos ao longo do tempo, porque
não depende de olharmos de determinada maneira ou tenhamos que competir com o
sucesso. Desta forma, permite-nos tanto a experiência de bem-estar como que
possamos contribuir de maneira significativa com a sociedade.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmnoWiRJ4zEBEtAXQ0sOTs1UpcGfc8KsoofgtjpJ-NMZhTRGtnAOjPp-4L_4hx7UJXhO0ELeJ7ZqN56YQojRthtDDeYsxAS09Js5EfeLmtq-qdZ3d8eeI18j3Ds0O3eB-pLtk27eq3egU/s1600/comp+2.jpg)
Embora a investigação sobre a fisiologia da
autocompaixão contra a autocrítica ainda esteja pendente, Neff determinou uma hipótese
a partir de um modelo simples. Sabemos que a autocrítica ativa o sistema
nervoso simpático (luta ou fuga) e eleva os hormônios do stress, como o
cortisol em nossa corrente sanguínea. Quando isto acontece, algo toma conta de
nós e não aprendemos a nos envolver com o núcleo da verdade que pode estar lá
só para nos servir. A autocompaixão, por outro lado, pode acionar o sistema de
prestação de cuidados dos mamíferos, os hormônios de filiação e amor, como a Oxitocina.
Também conhecido como o “hormônio do aconchego”, a Oxitocina é liberada em mães
lactantes, durante um abraço ou ao fazer sexo, e está associada aos sentimentos
de bem-estar, que nos permite manter a verdade, sem atacar a nós mesmos.
Desenvolvendo
a Autocompaixão
Nós todos conhecemos pessoas que parecem
cuidar de todo mundo, mas não cuidam de si – mesmas e ainda se repreendem por
não fazerem ainda mais. O trabalho de Neff confirma esta observação: não há
correlação entre o traço de autocompaixão e sentimentos de compaixão para com
os outros. Ela notou que muitas pessoas, mulheres em particular, são mais
compassivas e gentis com os outros do
que com si – mesmas. Ela dá o exemplo de uma enfermeira de oncologia pediátrica,
que passou a vida entregando-se ao cuidado dos pacientes, mas sempre alegava
não estar fazendo o suficiente.
No entanto, a autocompaixão pode ser
aprendida. É uma prática que pode ajudar todos nos a nos tornamos menos
autocríticos, e talvez até a conseguir mais para dar mais. Um grande exemplo de
autocompaixão é o de Bonnie Thome que se dedicou ao trabalho humanitário ao
longo de sua vida, começando com o cuidado às crianças de rua, jovens carentes
e prostitutas, elevando com sucesso os fundos para organizações sociais. Mais
recentemente, ela está liderando a agenda de financiamento para o centro da
Universidade de Wisconsin – Madison que prepara uma rigorosa pesquisa
científica para melhorar o bem – estar da comunidade. Bonnie explica: “A autocompaixão me dá permissão para
respirar a minha própria humanidade em cada situação que surge e me cumprimenta
e transmite essa energia em bondade para com os outros”. Para conhecer
Bonnie é necessário vê-la tirar proveito de todas as oportunidades enquanto
interage para conectar-se com os outros na amizade, com calor humano e na
intenção de servir aos outros onde ela puder.
Bonnie explica que, quando era criança, ela
recebeu uma enorme pressão para ser uma realizadora e ter sucesso. Tinha poucos
modelos de compaixão e era muito autocrítica. No entanto, quando foi colocada
em um orfanato, testemunhou a compaixão incondicional dos pais adotivos, bem
como o amor que dedicavam aos outros filhos adotivos de diversas raças e
origens. Bonnie atribui seu amor e respeito ao ambiente seguro que eles
proporcionaram para o seu desenvolvimento como uma pessoa mais integrada,
criativa e compassiva. Através da aceitação e carinho de seus pais adotivos, a
voz da autocrítica que havia dentro dela começou a se acalmar. Bonnie ainda
mantém aquela voz crítica de forma calma e tranquila através da prática meditativa
regular.
Os Três
Elementos da Autocompaixão
1.
Auto Bondade
–
Autocompaixão implica em ser caloroso e compreender a nós mesmos quando
sofremos, falhamos ou nos sentimos inadequados, em vez de ignorar a nossa dor
ou de nos flagelarmos com a autocrítica. As pessoas auto compassivas reconhecem
a imperfeição do ser, suas faltas e fracassos e em como as dificuldades da vida
são inevitáveis, por isso elas são gentis consigo mesmas quando confrontadas
com experiências dolorosas;
2.
Humanidade
Comum –
A Autocompaixão envolve reconhecer o sofrimento
e que a inadequação pessoal é parte da experiência, algo compartilhado
por todo ser humano, ao invés de ser algo que acontece somente a “mim”. Significa,
também, reconhecer os pensamentos pessoais, sentimentos e ações que são
impactados por fatores externos, como a historia da família, principalmente dos
pais, a cultura e condições genéticas e ambientais, bem como, o comportamento e
as expectativas dos outros. Thich Nhat Hahn (Monge Zen Budista) chama a
intrincada teia de causa e efeito recíproco em que estamos todos encaixados de “interser”.
Reconhecendo a nossa inter existência essencial nos permite ser menos críticos
sobre nossas falhas pessoais. Afinal de contas, quantas pessoas iriam escolher
conscientemente ter problemas de raiva, dependência, debilidade ou ansiedade
social, transtornos alimentares e assim por diante?
3.
Mindfulness – A autocompaixão
também exige uma abordagem equilibrada para as nossas emoções negativas, de
modo que os sentimentos não são suprimidos nem exagerados. Essa postura
equilibrada decorre do processo de relatar as experiências pessoais junto com
de outras pessoas que também estão sofrendo, colocando a nossa própria situação
em uma perspectiva mais ampla. Também decorre da vontade de observar nossos
pensamentos e emoções negativas, com mais abertura e clareza, de modo que elas
são mantidas em consciência atenta. Mindfulness é um estado mental receptivo,
sem julgamento no qual observamos os pensamentos e sentimentos como eles realmente
são, sem tentar suprimir ou negá-los. Não podemos ignorar a nossa dor e sentir
compaixão por nós mesmos ao mesmo tempo. Ao mesmo tempo, a atenção plena requer
que nós não nos sobre identifiquemos com pensamentos e sentimentos, de modo que
sejamos presos e arrastados pela reação negativa. – Kristin Neff, Ph.D.
Existem diversas formas de aplicar a
autocompaixão. Se desejar aprender mais participe do Curso de Terapia Focada na
Autocompaixão ou escreva para Saleela Devi.
Este artigo
foi publicado originalmente na Spirituality and Healh, uma revista que abrange
uma ampla gama de tópicos sobre saúde e espiritualidade, que podem incluir fé,
filosofia oriental, meditação e religião em geral; nutrição, bem-estar, Yoga e
medicina.
Texto adaptado por Sonia Ap F Santos (Saleela
Devi)