Uma visão budista sobre a morte o morrer
Este será o primeiro tema do circulo de palestras
sobre temas budistas deste ano, agora no Instituto Casa do Encontro. Assim gostaria
de falar um pouquinho sobre esta grande sabedoria que o Budismo nos revela em
seus profundos ensinamentos.
Vivemos tempos onde celebramos o nascimento e evitamos
falar sobre a morte, participamos de cursos sobre partos, cuidados com a
gestação (não que eles não sejam relevantes), mas ninguém comenta de cursos ou
palestras de como se preparar para que o processo de morrer possa ser feito com
presença plena e até mesmo com felicidade. Sim felicidade porque é o momento máximo
no nosso processo de evolução.
Os povos antigos se preparavam em vida para este
momento, hoje vivemos tempos de negação, a maioria considera até mesmo mórbido ou
deprimente a abordagem da morte, que é muito importante, pois afinal a morte é
inevitável, e mais cedo ou mais tarde todos nós vamos passar pelo processo do
morrer. Assim querendo ou não, é muito importante estarmos presentes e
conscientemente nos preparando para esta experiência que pode ocorrer a
qualquer momento, e é uma experiência muito preciosa. Para quem se dedica ao
autoconhecimento busca a evolução espiritual e o desenvolvimento humano, ser
capaz de aprender e provocar mudanças na sua visão sobre a morte e o morrer
pode se tornar uma das praticas espirituais mais relevantes.
A Abordagem Budista
sobre a Morte
Os ensinamentos budistas buscam preparar as pessoas
para a experiência da morte, treinando a mente para que o ser viva de forma
consciente e com uma visão bem aberta sobre tudo o que acontece na realidade.
Um dos maiores ensinamentos de Budha é que tudo é impermanente, é preciso
começar então aceitando que temos vidas finitas. Praticantes de meditação
avançados, não só em técnicas como Mindfulness (Shamatha), Loving Kindness (Metta
Bhavana) mas também as técnicas de meditação analítica como a do Insight (Vipassyana)
aprendem a apreciar a impermanência do momento presente – ou seja, o surgimento
e o desaparecimento de todas as coisas. Assim, desenvolver a capacidade que Mindfulness
proporciona, de estarmos atentos até mesmo na hora da morte pode ser
considerada uma experiência de profunda libertação – o ultimo desapego da vida!
Independente do sofrimento vivenciado, manter a consciência
clara de que a mente comum e todas as suas ilusões desaparecem no final, é a
grande chance de nos abrirmos para a percepção da consciência e descobrirmos
que a natureza da nossa mente é ilimitada. É de profunda relevância conhecermos
a natureza da mente enquanto ainda estamos vivos, e este conhecimento pode
levar tempo e deixar para buscá-lo no final, quando a morte se aproxima pode tornar tudo muito mais difícil.
Como o Budista se
prepara para a morte e o morrer
Os ensinamentos do Budha nos alerta que o estado
mental e mesmo o emocional que carregamos em nossa vida cria o karma que nos
leva ao próximo renascimento. Desta maneira, um dos princípios fundamentais é
morrer com o máximo de consciência possível, alerta a cada experiência do
processo do morrer e manter um estado espiritual saudável, reconhecendo cada
momento como único, por isso, o desenvolvimento da atenção plena é muito
importante, ela permite que não sejamos atormentados por emoções destrutivas e
sentimentos prejudiciais, abrindo espaço para o perdão, a cura de
relacionamentos e desapegos de bens ou de formas pensamentos. Sempre existe a
oportunidade de curar as nossas feridas da alma.
Cuidadores, enfermeiros e mesmo parentes que estejam próximos
de alguém que está passando pelo processo de morrer podem ajudar a melhorar o
estado mental, por exemplo: ajudando a lembrar das qualidades e virtudes da
pessoa, suas ações e memórias que promovem boas lembranças e felicidade.
Praticas de Loving Kindness (Metta Bhavana) ajudam a trazer a compaixão para si
mesmo e para os outros, pensar numa divindade de sua crença ou mestres
espirituais inspiradores, oportunidade de realizar atos de generosidade e
desapego, e manter um ambiente calmo e espiritualmente elevado.
Sobre o Karma
O karma de uma pessoa é na verdade uma verdadeira
coleção de energias formada pelas suas ações e reações, assim o karma pode ser
negativo, saudável ou mesmo neutro. E ele tem uma importância relevante na
determinação do plano de existência que a consciência kármica renascerá. Para aquelas
pessoas, que em vida alcançaram o estado de consciência de um Arhant (pessoa
que alcançou o nível do Nirvana) tanto no Budismo Theravada como no Tibetano, é
possível interromper o ciclo de renascimento; pois sua consciência pode atingir
o Nirvana eterno, para aqueles que ainda não atingiram este grau de despertar
da consciência, ele pode ir para outros diferentes planos de existência, que
são desde reinos superiores até inferiores, inclusive voltar para o reino
humano.
Para que não fiquemos, num ciclo vicioso, vagando de
um reino a outro, sem paz ou felicidade genuína é preciso que nos libertemos da
influencia do karma. Lembramos que Budha passou sua vida dedicando-se a
transmitir ensinamentos profundos de como podemos nos libertar deste ciclo de
nascimento e morte que provocam tanto sofrimento.
A Meditação sobre a
Morte
As escolas Budistas nos encorajam a dedicarmos
realmente um tempo para meditarmos sobre o processo de morrer e a morte. Devemos
aprender a tomar coragem para enfrentar nossos medos sobre o morrer e a morte,
de maneira direta, consciente e disciplinada. Assim podemos desenvolver uma
relação e valorização do processo de viver e da vida, ter uma relação
contemplativa e pacífica com a morte, o luto ou a perda de entes queridos,
porque reconhecemos a morte como uma parte inerente da vida.
Como nos preparar
Existem muitas técnicas meditativas sobre a morte
ensinadas por professores budistas, o processo do morrer e do estado
intermediário é descrito no Livro Tibetano dos Mortos escrito por
Padmasambhava. As pesquisas sobre a morte com pessoas que passaram pelo EQM do Dr.
Raymond Moody, Doutor em Psicologia pela Universidade da Georgia, revelaram
muitas fases já descritas neste importante texto do Budismo Tibetano. É lógico,
que diferentes pessoas, diferentes culturas, crenças e nível de consciência,
revelam diferentes percepções e experiências. Logicamente que devemos levar em
consideração todos os aspectos da história de um ser. Mas se a pessoa acreditar
na vida após a morte e/ou na reencarnação, pode ser muito benéfico se preparar
para o processo do morrer e da morte enquanto ainda estamos vivos e saudáveis.
Não sabemos se hoje é nosso ultimo dia, não existem
garantias que será rápido, indolor e pacífico. Mas a cada dia que acordamos,
precisamos reverenciar a vida, agradecer por mais uma chance de fazermos a
diferença, nos engajarmos numa vida espiritual harmoniosa com a vida material,
aprendermos a desenvolver a habilidade da atenção plena e a desfrutarmos cada
momento com discernimento e sabedoria, porque este dia pode ser o ultimo.
Você não precisa ser budista para se preparar para o
processo do morrer e da morte, todos nós vamos viver esta experiência,
independente de crença, sexo, idade ou qualquer outra coisa, os ensinamentos
estão disponíveis para todos os que desejam, e se tornam um caminho de evolução
espiritual e de gratidão pela vida.
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