sábado, 14 de março de 2015

Neurociência - Waking Dreaming Being

Parece haver uma guerra interminável entre ciência e religião, e o Budismo na maioria das vezes demonstra sua tolerância e sua relevância no mundo científico.  A gênese desta tolerância cultural começou com a ideia popular ainda na década de 1970, onde o Budismo estava de alguma forma, em harmonia com as fronteiras da Física Quântica. Enquanto, a alguns consideram uma tolice  a “espiritualidade quantum”, é evidente o suficiente nos dias atuais a possibilidade de que as tradições orientais possam ter algo a dizer cientificamente falando.

 O local mais natural do encontro entre ciência e religião  está no estudo da mente. Estimulado pelo engajamento notável do Dalai Lama, junto com a sua Fundação e com cientistas de diferentes universidades que desenvolvem a cada dia um interesse nas atitudes budistas em direção ao estudo da mente.

Mas dentro do alegre abraço do Dalai Lama encontra-se um dilema cuja resolução poderia abalar qualquer tradição ao seu núcleo: a verdadeira relação entre nosso cérebro material e a nossa mente decididamente não material. Mais do que evolução, mais do que os argumentos inesgotáveis sobre a existência ou não de Deus, a linha de falha real entre ciência e religião trata justamente da natureza da consciência. Desembalar cuidadosamente esta questão tão controversa e explorar o que o Budismo oferece na sua investigação é o tema do livro de Evan Thompson que tem o título  de Waking Dreaming Being.

Professor de Filosofia da Universidade de British Columbia, Eva Thompson assumiu um desafio. Construiu uma carreira estudando a abordagem da ciência cognitiva à mente; tornou-se intimo com a longa historia do Budismo, além de estudar e comentar a tradição Védica sobre a mente. Filho do historiador Willian Irwin Thompson, cuja Associação Lindisfarne propôs o “estudo e realização de uma nova cultura planetária”.  Eva cresceu nesse ambiente e com muito entusiasmo pelas tradições filosóficas não ocidentais e um ceticismo saudável com seus pressupostos espiritualistas.

“Waking Dreaming Being” começa com a valorização do impacto revolucionário da neurociência sobre a nossa compreensão do cérebro. Armado com ferramentas digitais de alta resolução, os pesquisadores mapearam as etapas críticas da cognição e da visão, além da linguagem e da memoria. O sucesso destes estudos, no entanto, levou alguns a considerarem como “neuro-reducionistas” – a proposição de que todos nós somos nada, além da gosma de nosso cérebro. Deste ponto de vista, a mente nunca é mais do que apenas a função cerebral. Uma vez que o funcionamento do cérebro pare de funcionar, a nossa consciência termina, nós terminamos e fim da historia.

Porém para outros, incluindo o próprio Thompson, algo essencial é deixado de fora desta conta neuro- reducionista. A vivacidade de nossa experiência não é nem encurralado nem esgotado por mapas ou traços de ondas cerebrais em um eletroencefalograma. Há uma “lacuna explicativa” pendurada entre a atividade neural e as experiências conscientes. Enquanto que esta lacuna levou alguns filósofos, como Colin McGinn argumentar que a consciência está simplesmente além da explicação cientifica, Thompson tomou uma outra direção.  Ele começou por nos lembrar que muito antes de Sócrates, o filosofo e meditadores do Norte da Índia já investigavam a consciência e sua dinâmica.

Quase 3.000 anos atrás, os primeiros praticantes védicos e, em seguida, os Budistas  articulavam sofisticados relatos na primeira pessoa de função cognitiva. Thompson argumenta que essas práticas contemplativas são implacavelmente empíricas. “Nas tradições Yogues”, escreve ele, “meditadores tem tanto a capacidade de serem abertamente conscientes de todo o campo de experiência sem selecionar ou suprir qualquer coisa que surja”.

Este treinamento torna a prática contemplativa diferente de tudo na caixa de ferramentas de um neurocientista. A dependência da Neurociência em instrumentos, descrições de terceira pessoa nas varreduras do cérebro significam que a experiência é filtrada. Como Thompson insiste em dizer, nossa consciência – o nosso Ser – simplesmente não é um tipo de ciência “coisa” que usam para estudar.

O título do livro ressalta a abordagem temática de Thompson. Seções sobre “Acordar” exploram a função cognitiva subjacente a atividade normal do dia a dia. Thompson em seus passeios pelo Abhidharmma do Budismo notou que o fluxo percebido pela consciência pode ser resolvido em momentos de atenção plena ou “momentos da mente”. Assim ele nos mostra em seus experimentos com a Neurociência moderna pode apoiar esta natureza discreta da percepção. As seções que tratam de “Sonhando” vão mais fundo, rejeitando a visão cientifica que muitas vezes declaram que os sonhos são simplesmente alucinações do cérebro: “Quando sonhamos, não temos “pseudo – percepções” que formam a base para falsas crenças; imaginamos um mundo dos sonhos e nos identificamos com nosso ego – sonho”. “A maioria de nós já teve algumas experiências de “Sonho lucido”” – reconhecendo que estamos despertos para o sonho enquanto ainda estamos dormindo. Mas para os Budistas na tradição do “Yoga do Sonho”, o sonho lucido é considerado uma habilidade treinável essencial para o progresso do aspirante como um adepto fiel da meditação: “Yoga do Sonho tenta nos mostrar como o mundo desperto ou mundo da Vigília não está fora e separado de nossa mente; é trazido e promulgado através de nossa percepção imaginativa”.

Estes são temas, segundo Thompson que os verdadeiros diálogos Leste-Oeste podem apresentar desafios fundamentais para a ciência. Todo o conhecimento do mundo, mesmo o conhecimento eventualmente transformado em forma cientifica, depende da experiência. Vivemos através e uma perspectiva que nunca pode ser totalmente livre. De acordo com Thompson que chegou a um acordo com o limite, em vez de varrer para debaixo do tapete, requerendo experiência em como tratar de forma primária e irredutível, uma noção bastante nativa das tradições contemplativas.

Thompson tem, no entanto, o prazer de espalhar os desafios ao seu redor. Com um equilíbrio mais do que evidente em sua discussão de “Ser” e, especificamente do “Morrer”. As tradições Budistas como a Védica estão profundamente comprometidas com a ideia de que a consciência persiste independentemente do cérebro. Thompson olha atentamente para a evidencia  do “fora do corpo”, a reencarnação e, em particular, as experiências do quase-morte com o anunciado “o céu é real”. Em todos os casos, ele argumenta, as evidencias apontam para essas experiências originárias de cérebros que são “desligados” ao morrer ou são “acionados” numa reanimação. O equilíbrio obstinado de Thompson nestas apresentações mostram as suas duvidas que “consciência – mesmo nas mais profundas formas de meditação – transcende o corpo vivo  e o cérebro”, onde tudo o mais é ressonante.

A Neurociência considera a vontade de morrer nada mais do que o inicio do fim da função cerebral, mas Thompson argumenta vigorosamente que as tradições contemplativas ainda oferecem uma ciência com uma nova e poderosa perspectiva. Para o Budismo, a dissolução da mente ocorre em camadas durante o processo da morte, semelhante ao adormecer. Como as pessoas que acompanham pacientes terminais sabem que o processo da morte pode levar horas ou mesmo dias. Assim, uma fenomenologia da morte – o que significa que detalhados relatos em primeira pessoa por aqueles treinados para assistir suas próprias mentes (incluindo a mentes em processo de morte) – seria um território fértil para futuro estudos neurocientíficos. Falando especificamente sobre relatos de experiências de quase-morte, Thompson pressiona um ponto que é muito vezes esquecido:

“O que isto significa em termos pragmáticos é parar de usar estas experiências para justificar os neuroreducionistas ou espiritualistas e, em vez de levá-las a serio  para o que elas realmente são – narrativas de experiências em primeira pessoa decorrentes de circunstancias que estamos todos a caminho de percorrer um algum momento”.

Essa citação resume este excelente livro de Eva Thompson.  Ante o debate que ocorre entre o ateísmo versus religião, ele nos pede para fazermos algo realmente radical retendo o julgamento sobre as grandes (talvez irrespondíveis) questões metafísicas de como devemos realizar nossas explorações. Em vez disso, podemos nos concentrar com honestidade e integridade de onde a informação experiencial empírica realmente reside. “Está lá”, diz ele, “bem diante de nós, na vida em que vivemos”.

Referência:
- Waking, Dreaming, being – Eva Thompson Columbia University

-  Adam Frank  no site  www.noetic.com

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