sábado, 21 de novembro de 2015

Mindfulness – O que é? – PARTE I




“Este é o caminho de convergência para a purificação dos seres, para a superação da tristeza e lamentação, para acabar com a dor e a depressão, para alcançar o caminho verdadeiro, isto é, os quatro estabelecimentos da atenção plena” – Budha – 47.18 Brahma Sutta
Uma Breve História:

A Índia e a religião hinduísta são o berço de quase todas as tradições contemplativas orientais. O Yoga (palavra sânscrita que significa – reunir, religar) aplica um vasto leque de práticas contemplativas desenvolvidas justamente para unir a alma (Atman) com o Supremo (Brahman).  São identificadas quatro escolas de Yoga:

·        Jnana Yoga (Yoga do Saber);
·        Bhakti Yoga (Yoga da Devoção);
·        Karma Yoga (Yoga da Ação);
·        Raja Yoga (Yoga Real)

O sábio Patanjali sintetizou os ensinamentos do Yoga nos conhecidos “Sutras de Patanjali” que contêm oito Angas, todo um conjunto de ensinamentos que que visa levar o praticante de Yoga a uma estágio evoluído de meditação até chegar ao Samadhi (ultimo Anga).

Além do Yoga, ainda temos os ensinamentos dos Vedas e do Vedanta que motivam a pratica meditativa com inúmeros Rish’s motivando a meditação como forma de estabelecer a sua união com o Absoluto Brahman. Muitos deles tornaram-se conhecidos do Ocidente como por exemplo Vivekananda, Yogananda, Osho, Ramana Maharishi e Maharishi Mahesh.

Encontramos práticas contemplativas também no Taoísmo, que tem como base o desenvolvimento harmonioso entre os seres humanos e o mundo (o chão da existência) que permanece o mesmo depois que todos os objetos sejam extintos. A terra da existência, o sistema de mundo e o método para se alcançar esta harmonia podem ser compreendidos quando se estuda o termo chinês Tao.

Em 535 a.C surge o Budismo com diversas técnicas meditação sentadas e passivas, entre elas temos a base da Mindfulness (atenção plena) conhecida como Shamatha. A atenção plena é um estado de consciência muito importante, em qualquer situação em que estejamos e estabelece uma perfeita harmonia com a experiência do momento presente – Budha já ensinava isto aos seus discípulos em seus discursos. O tema da importância da atenção plena ou Mindfulness é referência nos ensinamentos para percorrer o caminho da liberdade. É considerada uma atitude fundamental da mente em conjunto com uma ética bem fundamentada, assim na época de Budha já era bem conhecido o fato de que álcool e drogas destruíam a capacidade de manter a atenção focada e consequentemente a base para uma vida ética e moral.

Os ensinamentos da atenção plena formam a base para a compreensão intelectual do Dhamma, eram considerados muito importantes e todo discípulo deveria saber aplicá-los nos momentos mais significativos. Mindfulness protege os sentidos, dotando o praticante da meditação com prudência, dignidade e introspecção, desta forma não mais se permite ser tomado repentinamente pelos sentidos, desejos tentadores e outras distrações que levem a consciência para longe do momento presente. A atenção plena mantem a mente nas ações propositais e apropriadas moldadas no tempo e no lugar. A atenção plena é a base de todos os tipos de meditação budista, e é uma forma de refinada de consciência que distingue os níveis mais elevados de Samadhi – ou estados mais elevados de consciência. Mindfulness torna-se o combustível que nos permite compreender a impermanência e a causalidade, as permutações e transformações que ocorrem no cotidiano. Por isso, quando o indivíduo torna-se aperfeiçoado na prática de Mindfulness ele adquire uma qualidade inalienável de sabedoria realizada, ele passa a viver sempre atento e centrado.

Os estudiosos dos ensinamentos budistas logo observam a onipresença da atenção plena no Dhamma, da mesma forma que o sal é onipresente no oceano. A prática da atenção plena começa com a meditação Anapanasati (em Pali) ou Shamatha (Sânscrito), e é próxima ou quase idêntica a prática da Vipassyana ou a meditação do discernimento “insight”. Os ensinamentos estão presentes no Theravada Satipathana Sutta, escrito a mais de vinte séculos e considerado como o Sutta mais importante em todo o cânone Pali.

“O discurso mais importante já dado pelo Budha no desenvolvimento mental é chamado de Satipatthana sutta”  Maurice Walshe – The Long Discourses of the Budha

O Satipatthana Sutta é considerado por todos os budistas justamente a parte mais importante de todo o Sutta e a quinta essência do Pitaka e de toda a pratica da meditação” Bhikku Nyanatiloka – Caminho da Entrega pg 123

Existem centenas de cópias dos manuscritos sobre meditação em vários mosteiros, tornando o Satiphattana Sutta o livro mais influente e amplamente lido sobre meditação, e é o aspecto chave para a evolução da meditação Vipassyana Theravada contemporânea. Assim desde o princípio dos ensinamentos do Budha, as técnicas de meditação Shamatha e Vipassyana não podem ser divididas, uma é evolução da outra. Existem diferenças sutis na ênfase das diversas escolas budistas.

Enquanto Shamatha atua no desenvolvimento da atenção plena, foco e concentração, a Vipassyana atua como uma técnica meditativa que desenvolve o discernimento é uma técnica profundamente intelectual que visa dar ao praticante um discernimento direto sobre as verdades do corpo, sentimentos, consciência e os objetos da mente (Heinze, 1990).

Mas além destas duas importantes técnicas budistas, surgiu ainda a técnica do Zen com Bodhidharma (China) e mais tarde profundamente estudada e ensinada no Dogen (Japão – Escola Soto Zen), que também é uma técnica passiva, qie pode ser praticada sentada ou andando (Kinhin), com regras claras e bem definidas de execução que possibilita o alcance do Satori - uma repentina experiência consciente sobre a natureza da realidade (Watts, 1989).

Mas afinal o que é Mindfulness?

Mindfulness é uma técnica meditativa que permite que mudemos profundamente o nosso relacionamento com a nossa mente - pensamentos e sentimentos. Começa com um estado temporário de atenção plena que é acessível para qualquer pessoa, de qualquer idade e crença religiosa, estado este que pode se desenvolver com um conjunto de características permanentes para quem pratica com disciplina e diligência diária.

É uma técnica que exige um esforço para manter a mente em observação constante a algo que ocorre (Objeto da meditação), como o foco especial sobre uma experiência interior (como a respiração, por exemplo), sem avaliar, julgar ou participar. Muitos dos nossos processos mentais e emocionais têm como base a cognição e as partes inalienáveis de nossos “eus”. Nós nos vemos como pessoas que são capazes de sentir raiva, de não querer perder a paciência, ficamos deprimidos ou ansiosos, paranóicos ou tristes. Uma prática disciplinada da Mindfulness permite que a pessoa descubra as falsidades ou inverdades por trás destes sentimentos e pensamentos. Ao invés de ficarmos deprimidos podemos aprender a perceber quando e como a depressão nos atinge, o que nos leva ao quadro depressivo, aprendemos a lidar objetivamente com os momentos de dor ou a nos livrarmos definitivamente deles, não precisamos nos tornar escravos de nossos pensamentos, sentimentos ou emoções destrutivas.

Uma terapia baseada em Mindfulness permite o desenvolvimento da percepção imediata da experiência em contrate com as terapias mais tradicionais racionais ou emotivas e cognitivas que tentam transmitir a percepção a partir do terapeuta para o cliente. Desta forma, as terapias baseadas em Mindfulness começam a serem vistas como um valioso complemento a outras técnicas psicoterapêuticas e psiquiátricas, tornando-se um instrumento poderoso na caixa de ferramentas do terapeuta e até mesmo do médico e outros cuidadores.

Foi uma técnica que começou a milênios e que chegou ao momento presente como uma verdadeira tecnologia de atenção plena como uso terapêutico, com referencia de pesquisas empíricas sobre seus múltiplos benefícios, que já saíram do campo da saúde mental, chegaram à saúde física e alcançou a educação e o mundo corporativo.

Algumas noções básicas:

A forma mais simples de praticar Mindfulness é através da observação da respiração. Escolher um local, sentar-se confortável e corretamente (a postura é importante, para que a pessoa não adormeça) e manter-se focado na respiração é parte da prática meditativa. Mas qualquer pessoa que tente fazer este exercício simples vai logo perceber o quanto é extraordinariamente difícil. Parece simples, fácil, mas não é! Por quê? Porque a mente foge, vagueia imersa na corrente de pensamentos ruminantes ou fantasiosos, ela faz tudo menos simplesmente observar a experiência da respiração. E é justamente esta tensão que fica entre a intenção e distração que a pratica correta da Mindfulness procura resolver desenvolvendo a habilidade de estar atento e poder escolher. Faça a experiência – sente-se por alguns minutos apenas, sem fazer nada, apenas respire, apenas concentre toda a sua atenção na respiração natural e sem esforço e observe como se sente enquanto simplesmente respira sem fazer nada. É muito comum que surjam muitos pensamentos e diferentes sensações, também é comum que o praticante se sinta entediado, acreditando que está perdendo tempo, que nada está acontecendo de fato, já vi pessoas dormirem! Mas existe um recurso, quando o tédio surgir, pare de respirar! Aperte o nariz, feche a boca!  E com certeza você vai querer respirar intensamente (Kabat Zinn, 1990).

Se você fez o exercício, percebeu duas coisas: 1) a dificuldade de não fazer nada e, 2) a descoberta que você não tem controle sobre a sua atenção como acreditava ter!

Quer fazer outra experiência? Sente-se por uns três minutos, sem fazer nada, apenas observando a respiração. Note que do nada irão surgir pensamentos, emoções ou sensações, algo como: O que vou comer depois? Que tédio ficar aqui sentado? Onde está o meu celular? Ou outro pensamento qualquer. Mas o que é importante é que você não deve dar vazão a estes pensamentos, não pense na comida, ou no celular, não se levante, não desista, apenas reconheça o que está acontecendo, anote mentalmente e deixe de lado voltando a sua atenção para a experiência da respiração. Esta tríade – observar/reconhecer/observar – que é o coração de uma prática de Mindfulness.

Referência:

·      A History of Mindfulness – Bhikku Sujato
·      Full Catastrophe Living – Jon Kabat Zinn
·  Mindfulness: History, Technologies, Research and Aplications – Luis F M Knight

Contato com Sonia A F Santos (Saleela Devi) – Professora de Mindfulness Based Stress Reduction e Mindfulness Therapist – E-mail: saleela.devi@gmail.com

Leve Mindfulness para seu espaço, empresa, cidades/estados – Informe-se a respeito!

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